Saga & Almerinda Gaspar

 


You're not alone


Viagem apoteótica


Não fechei, 

os olhos, não me permiti,

semicerrados apenas

ventanas para nenhures

e toda a noite acordados

ouvindo acordes

que subiam

enquanto 

eu 

descia 

ao inferno

de Dante,

a Georges Bizet

com a Carmen

e muitos cigarros depois

a apoteose de opus 27 adagio

de Rachmaninov

e o Fantasma da Ópera 

em memória

eu e tu somos história

que não acoplou

pelo tempo bizarro

de não mais ser nosso

só meu, o teu

coração puro lento

e o meu

cozido com bainha

stentista

nem médico de cabeceira

nem cardiologista

o derrotam

apoteose outra vez

e Lizst 

acompanhado 

de xanax

nem o mago Merlin

nem ninguém

nem nada

nem assim

nem madrugada,

olhos esbugalhados

sono nenhum

e tu longe

e eu longe

e eu perto

a levar-te música ao 

sono incerto

só ou acompanhado

e tu duro, pedra e cal

e tu, só, frio, 

e eu nesse abandono

e eu longe

e tu perto

e nós longe

de qualquer encontro

exceto

nestes excertos

musicais

nos meus sonhos

e ideais

e essa resposta 

cozinhada 

de silêncio

nunca mais

eu aí e tu algures

eu aqui contigo nos olhos

da memória

deste amor

esgotada história

e o antrax

e

este

abismo

de 

não encontrar

descanso e cismo

de sonhar-te

que te quero longe

de te sonhar dentro

e mais perto

e decerto, louca vou

para mais um dia de cansaço

onde te sonho e te abraço

mas só de olhos abertos.


Porque

se os cerro, periga-me a alma

de não te sonhar

e

eu

preciso

te

encontrar

e

tu

foges

para longe

para dentro 

dess' outra mulher

que creio não te mereça 

mas que compõe em ti 

o preenchimento, o agora

e

desse

nós que já é 

somente história

só no relento

encerrado

do que invento

do que sonho 

do que intento


Imagino essa rua

vazia

fechada,

cheia de obras

pontuais

na tua porta FECHADO

no teu coração encerrado

por decreto, já concreto

e

por 

ausência de sinais

mais que nunca

o NUNCA MAIS


onde parto, como ficas

como fico, onde vais


é verdade que continuo 

inteira

guerreira

diretas somo nos olhos

e no esqueleto

mas

o que eu dava

para que esta

partitura

somasse

bem mais

apoteoses,

acordes em ré maior

enlaces em fá sustenido



desfaço-me de ti

des faço o teclado

concerta-me a nota do lá

com a nota de sol ferida em mi

em mim e o si bemol determina

o fim do roland, 

o fim de tudo

o fim deste prelúdio

no espírito

estúpido, insipido

martelo este teclado

sem defesa

teimosamente

descompassado

descompensada

de beijos que já não dou

não estou

não sou

a mesma,

já só

tristeza

angústia

frieza

desprezo

silêncio

e

amor

e

mais saudade

mas...

na melodia dos pardais

não há nem mas, nem mais

não mais

uma palavra

um fonema

um suspiro, 

um dilema,

um sussurro

uma jura gasta

de não mais ficar

ficar mais

na espera

do meu caixão

Com Neptuno

em Escorpião

Sim,

pode morrer-se de amor

ou viver dele



e no céu, lá fora

o sol já nasceu

(em Julho)

porque me fere a luz

porque prefiro a névoa

porque cogito

grito, penso e não reajo

aceitando o fim?

Nina, encerra!

Aterra!


Teimosa

mente

sangrando

até esgotar

até me perdoar

que não tenho culpa

que sou a rosa

de espinhos parida,

que não mereço glosa

nem prefácio nem

interstício

que me precipito

porque não desisto eu

desta partitura,

deste poema

em dó crescente

com uma lua pendurada

à espera de te ver chegar


Sou a estrada que te esqueceu

o meu caminho não consta

do teu gps

o percurso

que fazes

é noutra realidade

cidade

corpo

mulher

eu

folha de rascunho

vazia

e amarrotada

a música

parece ser 

a minha estrada

não mais ensaio

e tudo o resto

tudo

tudo

ou nada

do que vier

será 

a minha casa

o meu amor

e num golpe de asa

te apago no céu. 

Não, não és meu

E o que para nós acabou 

Em Schubert continua inacabado

o oitavo andamento

e trauteio o lamento


folha rasgada do livro

que não havia de ser escrito

Edito-o mesmo assim

em branco, impresso

e disperso

o beijo

o grito

este desejo aflito

de te observar

nas moitas dos

sonhos que só eu

alimento

secretamente

prolongando

engrossando

esta

agonia

de valsa lenta

Termino

over

finito

com Mozart em requiem

para este teu, 

meu coração 

mirrado e despido

para ti.

Mercúrio retrógrado

não tem culpa

Para mim, 

Júpiter envolveu-se

com Marte,

depois que Plutão entrou em ti,

Saturno no meu nodo norte

Para Áries a lição

e o fim da repressão

Completude

Só depois,

como cantou a Marisa Monte

E agora toca o gongo

para o almoço

e Melgaço

e a festa do Alvarinho

e ter paz

e beber vinho

brindando ao fim

da estagnação.

Chegam notícias de Libra?

Pobre carteiro

que já não se livra de mim

e nem ele do arcano maior

da Justiça.



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