Pra que não digam que não falei de sementes
Há dias atrás, rasurei uma crónica sobre a minha cadela e os seus filhotes. Que nasceram nove. Que dois tinham partido para Baião, um macho e uma fêmea e que mantinha sete comigo. Acreditando que eram quatro machos e três fêmeas.
São seis machos. Disponíveis para adoção. Fica aqui a retificação.
Quanto ao restante, do 25 de Abril neste país, nada sei, exceto que devem andar a comemorá-lo pelo país todo, sobretudo a classe política, tão pródiga em elencar a liberdade e a comprometê-la, a apregoar a fraternidade e a "exclusivá-la" para os seus amigos, a vender a igualdade que não querem que se estenda, pois, compromete os seus planos políticos, económicos e sociais, constantes nas suas agendas.
Todos sabemos que temos uma classe política comprometida em todo o mundo, mas se nos basearmos neste pequeno país pacífico, à beira-mar plantado, damos conta que a corrupção existente por aqui é a amostra significativa, ainda que insignificante à escala mundial, que os fascistas usam o 25 de abril como oportunismo para a sua escalada social e de repescagem de votos dos votantes descontentes de todas as alas, desde a liberal à mais ortodoxa, rumem eles à esquerda ou à direita. O populismo crescente é uma péssima semente, desvirtuosa, qual erva daninha no processo de democracias transparentes. Enganam-se os tolos com os bolos e isso é notório, visível e demasiado previsível para que não vejam.
As novelas de corrupção vendem revistas e jornais como pão com manteiga em dias de inverno, desde os partidos com menos representatividade até ao altar da república, de uma falta de virtuosismo e de falta de sentido de estado. Envergonho-me desta cepa de vendilhões que nem vergonha têm com a falta de compromisso e responsabilidade na condução e no governo da nação. Em 2014, dizia Eduardo Lourenço, ideologias do senhor à parte, de um povo que não governava e nem se deixava governar. Passos aproveitou-se para elencá-lo, mas sabemos bem a que sabe a política deste senhor, sabemos como se cozem por dentro e que se protegem uns aos outros de um militarismo e cooperativismo que transcende a falta de vergonha. E a alternativa dos socialistas derrotou e hipotecou a esperança dos portugueses. E a sua maioria, também ela previsível. E cantam e dançam o 25 de Abril sem pensar nas soluções para um país cujo povo lhes dá corda, para que esta classe política nos enforque a todos.
Sou bisneta de um comunista ereto e digno, neta de um comunista socialista e filha de um socialista que morreu em abril, em vésperas de ver a deriva que haveria de parir a sua luta por uma sociedade progressista, com valores que já nasceram em França, na tal triangulação da liberdade, fraternidade e igualdade.
Vendemos os ideais a troco de muito pouco, nós povo, para que os académicos da palavra e dos ofícios da pilhagem possam defender as suas posições e fazer da carreira política a arte da pilhagem legal.
Sou uma descontente destas sementeiras e por tudo isto, me agarro a estas novas gerações, acredito que estas gerações vindouras ainda possam fazer de nós gente de valor, de ideais e de trabalho responsável, para que não se apague a chama da dignidade e da evolução, para que se não propague a continuidade deste banditismo a céu aberto.
Tenhamos vergonha, tenhamos coragem, reflitamos sobre os destinos de um país que tem todas as condições para ser um exemplo de sucesso na tal triangulação de valores. Façamos abril de novo, fresem-se os campos do desgosto e da falta de coerência e lavrem-se com novas sementes tudo de novo. Deixemo-nos de hipocrisias que não nos levam a lado nenhum, a não ser aos senhores a quem entregamos de olhos vendados o poder. Ensinemos os nossos filhos a ser cidadãos interventivos, interessados, participativos e que possam erguer e honrar a terra que os vê nascer, sem a necessidade de emigrar porque não há trabalho, sem a necessidade de serem escravos noutras terras além-mar, a fazer o mesmo que fazem aqui e a ganhar três vezes mais. Elimine-se a fonte de todo o mal. Não permitam que o ofício do compromisso e da responsabilidade política seja entregue a quem quer fazer dinheiro, tráfico de influências, e outras alarvidades que não nos conduzem a boas colheitas.
De Abril em flor, este amargo de boca que fica.
Escolhamos as sementes do que queremos ver florir, não deixemos que sejam outros a escolher, não confiemos o nosso oiro, não o entreguemos a malandros, a sociedades de advogados que zelam pelos seus próprios interesses, a empresários do capital alheio e a "empreendedores" do bem comum. A oportunistas de bem alheio.
Com o meu café a terminar, com a minha esperança a mirrar, com a minha boca a vomitar destas comemorações neste feriado que é vazio de conteúdo, que a bota não bate com a perdigota e que nos vamos arrepender se deixarmos o país ao sabor do vento. Que os ventos populistas vingam em terrenos e matas selvagens. E depois é que vem o ai meu deus! A democracia não é a corrupção. A democracia que está implícita ao 25 de Abril não é fácil, não é assegurada, não é algo que possam comprar. Não se vende democracia, não se vendem ideais. Trabalham-se. Ensinam-se. Exigem-se na construção social. É isso que faz falta, afinal.
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