José Agostinho Baptista




Despedida


 

Uma harpa envelhece.

Nada se ouve ao longo dos canais e os remadores

sonham junto às estátuas de treva.

A tua sombra está atrás da minha sombra e dança.

Tocas-me de tão longe, sobre a falésia,

e não sei se foi amor.

Certo rumor de cálices, uma súplica ao dealbar das ruínas,

tudo se perdeu no solitário campo dos céus.

Uma estrela caía.

Esse fogo consumido queima ainda a lembrança do Sul,

a sua estrema dor anoitecida.

Não vens jamais.

O teu rosto é a relva mutilada dos passos

em que me entristeço, a absoluta condenação.

Chove quando penso que um dia as tuas rosas floriam

no centro desta cidade.

Não quis, à volta dos lábios, a profanação do jasmim,

as tuas folhas de outubro.

Ocultarei, na agonia das casas,

uma pena que se esvoaça,

a nudez de quem sangra à vista das catedrais.

O meu peito abriga as tuas sementes, e morre.

Esta música é quase o vento.

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