Feel So Different
O meu mundo feito de ti
Depois do mundo te ter levado de mim, passei a caminhar de olhos baixos, sem ver, projetando no outro o meu ser, e desapreciando-me, de um tamanho desgosto de o mundo continuar sem ti, tentando preencher um vazio que eras tu de proporções descomunais, e fui dando lugar aos demais, e, chegada aqui, quando me foi dado o gosto de te ver e te falar, de te olhar novamente, depois de teres dobrado a esquina, mais uma vez, de partida para outras escolhas, depois de ti, que tu és marco histórico em tudo o que vivo, deixei que as sombras que me acompanham, me habitassem, me fizessem a doce companhia que só tu fazias! A paz sobreveio aos intervalos acariciar-me as tuas lembranças, o vento tirou tudo do lugar, mas tu permaneceste!
Como amo toda a sombra do silêncio, a solidão do teu rosto, a procedência dos meus pensamentos e dos teus atos que se não fazem, a não ser dentro de mim, a fotografia antiga, a alegria permanente do teu sorriso, dos teus olhos desiguais, dos teus cachos de cabelo na minha mão, do teu humor constante, do teu intelecto, da novilíngua que foste criando na minha pátria, dos teus beijos, abraços e desejos, tu sempre foste o engenheiro, o compositor, o arquiteto da minha casa, o meu adamastor predileto. E então, na tua ausência física, aprendi a amar-me, a priorizar-me, a ser eu a dar-me o que me davas tu, a dar-me destaque e valor, amor, tanto amor que me dou por ti; que depois de ti, enquanto partiste, ficaste, e tornaste-te muito mais que a memória, muito além das imagens, da história do país sem glória, depois de ti, ao nada transformei-o, assim, ainda em ti, no meu corpo, em ti, na alma e no espírito e faço destas imersas viagens o percurso da solidão mansa, depois de ti, as sombras, tomaram conta da nossa casa e é ainda nela que habito e que me faço feliz.
Depois de ti, volto ao antes, sempre, jardim, criança, no melhor de mim, onde ainda te posso encontrar, semeada esperança no mês do estio, em agosto.
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